sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Violência

Quando vi o que estava acontecendo, percebi que não tinha mais volta. Os dois grupos engajado em uma batalha, cerca de 40 pessoas de cada lado, alguns carregando garrafas de vidro quebradas, canivetes, tacos de beisebol, e outros sem nada, apenas com seus punhos, mas com os olhos brilhando cheios de raiva.
Eu estava um pouco distante, vendo a cena de longe. Uma tarde nublada, com uma chuva prestes a cair, o espaço era uma rua antiga e larga, do subúrbio, aparentemente abandonada, pois as lojas estavam todas fechadas, os muros pinchados e postes quebrados. Lixos se espalhavam pelos becos, emitindo um fedor que se misturava com a umidade do ar.
Os dois grupos correram um em direção ao outro, todos gritando, e quando se encontraram, foi uma das cenas mais lindas que já vi, as pessoas com tacos e pedaços de madeira, batiam em seus oponentes na cabeça com força, deixando eles desorientados por alguns segundos, então derrubavam eles no chão e começavam a chuta-los na boca do estomago fazendo eles cuspirem sangue. Vi um homem de quase 2 metros esmagando a cabeça de outro com seus punhos, uma mulher com um canivete rasgando o rosto de um oponente da boca até as orelhas rindo enquanto o sangue espirrava em seu rosto. O cheiro doce do sangue se espalhou pelo ar, e quando chegou a meu nariz, fui acometida de raiva e ansiedade, minhas mãos tremendo com a vontade de entrar na briga desceram até o bolso traseiro do meu jeans, e meus dedos logo entraram e se acomodaram no meu soco inglês, aquela sensação gelada e familiar que a tempos não tinha.
As pessoas temiam que eu entrasse na briga, pois quando começo não consigo me controlar, não faço mais diferença entre amigos e inimigos, meu único sentimento é um prazer imenso imerso em raiva, e perco a razão.
Eu não conseguia mais me controlar com o cheiro de sangue e aquela linda visão a minha frente. Em um impulso, me soltei das mãos que me prendiam, e corri a toda velocidade ao encontro da batalha, eles até tentaram me seguir, mas sou mais rápida, e em menos de 2 minutos já estava no meio.
Um punho veio em minha direção, eu me esquivei abaixando, tirei minha mão com o soco inglês do meu bolso e ainda abaixada acertei ele na boca do estomago, só quando levantei meu olhar que vi em quem batia, era um homem ruivo de baixa estatura, do grupo oposto, eu acho...
Ele tentou me chutar pela lateral, eu segurei sua perna no ar com um braço e soquei com o outro bem em cima do joelho ouvindo aquele maravilhoso som de ossos se quebrando. Meu inimigo caiu se contorcendo de dor, e comecei a chutar suas costelas, quando senti uma mão segurando meu braço por traz, e me virei de uma vez dando um soco no rosto de uma mulher.
Tinha a estranha sensação de que a conhecia, porem meus sentidos estavam confusos, e eu só pensava em bater e extravasar minha raiva. A mulher me olhou com espanto e começou a gritar comigo, eu dei uma joelhada, e enquanto ela perdia o ar soquei seu rosto com tanta força, que meu soco inglês rasgou um pedaço da pele de sua bochecha, ela caiu arfando, quando comecei a chutar sua cabeça até perder a consciência, e só então parei. Um homem caiu ao meu lado, desmaiado, e percebi que ele tinha um canivete em uma das mãos, eu me abaixei e peguei o canivete. Corri um pouco mais para o centro da luta, onde varias pessoas já estavam mortas ou desmaiadas no chão, uma mulher de cabelos curtos e loiros estava de costas pra mim... Uma péssima ideia da parte dela...
Sem dó nem piedade, enfiei o canivete em suas costas, na base da coluna e subi até quase nos ombros, sangue espirrou em mim, um pouco perto da minha boca, eu limpei ele com a língua, sentindo aquele gosto doce, e enquanto a mulher gritava de dor, uma gargalhada explodiu da minha garganta. Eu estava descontrolada, e sabia disso, mais era a melhor sensação do mundo. Meus braços começaram a tremer pedindo mais, e minha mente pensava apenas em continuar a bater, bater até morrer.                               

                                                                           Raissa Istvan

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Auto análise..!

Como é calmo o mar...
Calmo e tempestuoso ao mesmo tempo...
Como minha mente!
Apresenta uma superfície plana que se estende até onde a vista alcança, com uma cor azul tão intensa, que a primeira vista todos ficam fascinados.  Mais só quem mergulha nele, que o conhece realmente. Cheio de criaturas marinhas das mais diversas, bonitas, feias, algumas engraçadas, umas inofensivas, e outras são monstros sanguinários...
Apresenta locais com água cristalina e lindas barreiras de corais coloridas, cheias de criatividade, mais também apresenta os mais profundos e obscuros abismos, que ninguém se atreve a descer, e quem vê o mar por fora, nem imagina que ele abriga tais obscuridades.
Calmo e tempestuoso...
Claro e escuro...
Lindo e medonho...
Salgado, como minha mente!

                                                                      Raissa Istvan


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Porque eu não consigo me prender a este mundo?
Porque a minha realidade não me satisfaz?
Talvez por isso eu leia tanto, em busca do conforto e das aventuras que eu almejo mais minha realidade não me proporciona.
Tem dias que acordo com uma enorme vontade de, como a Lucy, entrar em um guarda roupa e descobrir outro mundo, uma vontade tão grande que tudo a minha volta se torna enfadonho. Torno-me prisioneira dos meus pensamentos, da minha imaginação e dos meus sentimentos, crio mundos fantásticos na minha cabeça, com histórias incríveis, e viajo por eles tão intensamente que quando sou obrigada a voltar a minha realidade, a tristeza toma conta de mim.
Imagino que o mesmo ocorra com algumas drogas, levando as pessoas a euforia, para depois leva-las a abstinência e a depressão. Minha droga é a minha imaginação, mais eu considero uma droga boa, pois eu sei que nunca vou me adaptar totalmente a minha realidade.
Ela é meu refugio, um local apenas meu que ninguém mais tem acesso, e que eu posso visitar sempre que sentir vontade.
Sei que esse texto está um pouco depressivo e misantropo, mais infelizmente (ou felizmente) é como estou me sentindo hoje, e resolvi compartilhar, talvez alguém me entenda e sinta algo parecido.
                                                                     
                                                                                                               
Musica perfeita para tais pensamentos:  http://www.youtube.com/watch?v=E7iJFu2v9x0                                                                                                                                                                   Raissa Istvan

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Oque passa pela minha cabeça quando ouço a musica The Kraken, da trilha sonora de Piratas do Caribe.

Eu sempre imaginei essa cena como um vídeo, e com desenhos, mais nunca realizei desse modo, então resolvi escrever:

'Três seres andavam pela rua, ambos obstinados, mais não qualquer ser, eram de uma das espécies mais raras, com corpo humano e cabeça de tubarão martelo!
Os três bem vestidos de terno e gravata, alinhados. O primeiro com as mãos nos bolsos, o da direita com as mãos seguindo seu caminhar, e o da esquerda com apenas uma mão no bolso, e a outra martelando em sua perna no ritmo de uma musica forte imaginária.
Ambos andavam em linha reta, com o olhar fixado em seu caminho, os outros seres, apenas desviavam quando eles passavam, pois era o único a ser feito. Todos sabiam do poder dos cabeça de martelo, eram a maior máfia do submundo, e ninguém se atrevia a ir contra eles, nem o próprio governo.
A cada esquina que eles viravam, estavam sempre ritmados, como se fosse um clipe de uma musica que apenas eles ouviam. Assim que eles chegaram a praça central, todos que ali estavam abriam caminho, e os três sentaram no banco do meio, com postura despojada, o da esquerda se sentou na parte de cima, tirou um cigarro, entregou ao do meio, que colocou na boca, enquanto acendia com seu isqueiro dourado.
O da esquerda olhou por um instante para o relógio em seu pulso, e chamou a atenção dos outros dois, era hora do espetáculo começar:
Os três olharam juntos para frente, para uma enorme igreja estilo gótica no centro da praça. A população logo percebendo o que estava prestes a acontecer, saiu às pressas, parando nas ruas em volta a praça para presenciar.
Exatamente ao meio dia, quando o pequeno relógio de pulso de um dos três apitou 12 vezes, a igreja explodiu, varias cores faiscavam no ar, vermelho, azul, verde, e pedaços da igreja voavam por todos os cantos, partes da vidraçaria caiu aos pés deles, que não sorriam, apenas assistiam ao espetáculo friamente.  A população assistia estupefata, sem entender o que os levou a fazer isso, mais ninguém se atrevia a perguntar.
O apesar de ser meio dia, o céu se iluminou intensamente com a explosão, e o calor irradiou por toda a praça.
Quando a explosão terminou, e apenas os destroços da igreja podiam ser vistos, os três se levantaram simetricamente, e sem olhar para ninguém, e voltaram pelo mesmo caminho de onde vieram.'

                                                                                        Raissa Istvan

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Caronte -Inspirado na obra - A Divina Comédia, de Dante.

                             

‘’Porque zombas Caronte, das pobres almas que aqui se alojam
  Almas a espera de sua dor eterna, do fogo e do gelo
  Alma aos prantos, sem esperança de revê-lo

  Não percebes que sua pobre alma
  também está fadada ao exílio eterno?
  Passará a eternidade sobre o Aqueronte
  guiando esses temerosos para os montes.

  Nunca descansarás de sua labuta eterna
  e poderá ver apenas o vislumbre de um sonho
  de talvez um dia alcançar a luz externa. ‘’


               -Raissa Istvan 


quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Influência...

Durante aquele momento, sentada naquele banco de praça, ela olhava no fundo dos olhos dele, ouvindo sua voz, seus relatos que a tranquilizavam de um jeito estranhamente reconfortante. Ela se sentia feliz, e sorria. Não o sorriso que era acostumada a dar, apenas por convenção, mais sorria de verdade, pois se sentia feliz. Tudo o que ele dizia, era absorvido por ela como uma esponja absorve a água. Ele próprio não tinha noção do efeito que causava nela, da influência que tinha sobre ela.
Admirada, sua atenção se desligava de tudo a sua volta, dos carros, as outras pessoas que passavam, a vida continua que acontecia a sua volta, tudo era desligado e sua atenção se voltava apenas para as palavras dele, se esforçando ao máximo para gravar tudo o que conseguir aprender ao máximo, e impressiona-lo, pois sentia essa vontade em seu intimo!
O tempo parecia não passar, e quando se deu conta, já era hora de partir.
Então tudo desabou! O mundo desabou a sua volta, teria de voltar a sua realidade, e ela tinha certeza que sua realidade a observava de longe, apenas esperando esse momento para voltar a atacar. O medo a dominou novamente, e após se despedir e começar a seguir seu caminho sentiu como se aquele breve momento de alegria e aconchego tivesse ocorrido a séculos atrás...
Não foi necessário colocar o fone de ouvido, as notas de Toccata and Fugue¹ vinham a sua cabeça espontaneamente, formando a melodia que a perseguia dia e noite. Enquanto subia a rua escura e deserta, tentou ao máximo controlar suas emoções, manter sua respiração estável, e pensar em coisas agradáveis, tentando enganar seu medo. Ele próprio havia falado com ela, que somos nós quem criamos nossos medos, e que apenas o criador, tem como parar o que começou.  O problema é que a muito ela tinha perdido o controle sobre aquilo, de tal forma que isso a dominava todo momento em que estava só.
Quando virou a esquina, sentiu sua presença, ouviu seu sorriso sardônico em sua mente, e sabia que aquilo estava próximo. Sem seu consentimento seus dedos deslizaram para seu pulso em busca da sua lua crescente, quando se lembrou que ela não estava lá, havia perdido, e nada mais a protegia agora. Nesse momento parou, pois na próxima esquina estava a silhueta daquilo, suas mãos começaram a suar, e os pelos de sua nuca arrepiaram. Não tinha mais como voltar, esse era o único caminho. Então lentamente ela andou em direção ao seu pior pesadelo, e quanto mais chegava perto, mais seu pesadelo sorria diabolicamente, até que ele com um simples gesto de levantar a mão a fez congelar. Ela e tudo a sua volta, pois o carro que vinha de longe também parou. Sem poder mover um músculo, ela encarou, enquanto ele vinha em sua direção, sem olhos, sem nariz, apenas um sorriso diabólico em uma silhueta de sombra. Era agonizante não poder fechar os olhos, e ele tirava vantagem disso.
Parou na frente dela, e nada dizia. Apenas se divertia a encarando, ele deu  a volta, e parou atrás dela.
‘’Eu sei o que você está sentindo’’ Soou a voz dentro de sua cabeça, ‘’você pensa que encontrou um refugio.’’
‘’Não se engane, nada disso é real! Você como ninguém sabe disso, mais insiste em acreditar e manter essa farsa. Nunca se esqueça que eu sempre estou perto de você, a todo momento, a todo instante, até o dia marcado.’’  Seu coração disparou nesse instante, pois sabia que o dia estava chegando, e não tinha como fugir dele. ‘’E ele, será muito importante para o final’’
Não pode ser, a nenhum momento eu imaginava que colocaria ele em perigo, sobre algo que não tenho controle, tenho que livrar tirar ele fora dessa, custe o que custar .- Ela pensou
Nesse instante foi cortada de seu devaneio pela buzina de um carro, e o olhar de um motorista impaciente e estressado.
Tinha acabado... Aquilo se foi!
Não... Ele nunca iria, e ela sabia disso. Pelo menos não até o dia final. Ainda com a respiração ofegante, se apressou em direção a sua casa, ignorando todo o resto ao seu redor.

¹Composição de Johann Sebastian Bach
                                                                    Raissa Istvan

Não deixa de ser peculiar!

Verde, azul, amarelo, vermelho....
Vermelho? Espelho!
Espelho? Vitrine!
Enquanto ando por esse calçamento de brasas, olho para o lado, e vejo uma vitrine. Meus olhos refletidos nela, e através deles, calçados! Muitos calçados! A vitrine se quebra em milhões de pedacinhos e os calçados um por um começam a flutuar.... caminhar em volta de mim. Não paro de andar um segundo, pois o tempo é curto, e eu curto cada milésimo como se fosse o ultimo dos moicanos!
Se não bastasse os sapatos a minha volta, que aparentemente ninguém parece notar, pois estão todos apáticos seguindo cegamente, sem mente enquanto mentem seus caminhos. As vitrines de vestidos de noiva alçam voo, e todos aqueles vestidos brancos em pranto, na esperança de terem esperança seguem seus caminhos sombrios até a igreja mais próxima, formando filas de noivas zero, sem noivos para satisfazer seu prazer de ser, para depois apenas padecer.
Ao meu lado vejo um samurai aposentado, coberto por chocolate. Ele me lança um sorriso sardônico, sem vômito, esperando ver espanto em meus olhos. Que perca de tempo... Meus olhos já estão acostumados a tais eventos, não perdendo nunca minha admiração, que não deixa de ser sem noção.
A cada esquina arvores que na verdade são ents, e que estão doentes rezam pra serem notadas, Tolkien já previa tudo isso à anos luz atrás. Continuo sempre a andar, sem nunca parar, até que um fusca verde reluzente passa por mim, com uma enorme caixa de som, que tem o poder de fazer as ondas sonoras ser vistas, ondas multicoloridas que deformam o tempo e o espaço relativamente, de um jeito que deixaria Einstein sem palavras e sem língua!
A míngua, crianças amargas, fascinadas e  fantasiadas de abelhas tentam sem sucesso voar, são baixinhas, e vejam só! Adivinha quem está aqui?
A rainha dos baixinhos, em carne e osso!  Ela desceu em sua nave oval, trazendo consigo vários peixes fluorescentes que caem do céu vindo de realidades diferentes. Nesse momento gatos de cor amarelo Nápoles começam a brotar de cada beco visível, fazendo o possível e o impossível para degustar seu jantar.
Agora que já estou quase no final, me pergunto: Onde está a minha coesão textual? Não consigo encontra-la! Acho que a perdi em meio as várias marcas e logomarcas que se locomovem por essa realidade sórdida que deveria ser o projeto de uma cidade, mais não é, pois esse projeto só pode ser alcançado se houver uma luz. Uma luz verde, azul, amarelo, vermelho...  E essa luz nunca poderá ser alcançada por mãos muito menos tentáculos humanos. Seu segredo está guardado talvez no mercado, mais como eu, uma mera imortal não tenho acesso a ele, resolvi apenas gravar todo esse relato em minha caixola, para quando chegar em minha pequena toca, escrever tudo com meu lápis, que na verdade é uma caneta, que na verdade é uma cenoura muito descontente com sua classe social...
Provavelmente sentirei  vontade de compartilhar esse relato, com mais pessoas apáticas incluídas no submundo da internet, não me excluindo desse meio, sem o qual não semeio minha loucura!              

                                                             !Raissa Istvan!

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Morgana fala...

Em vida, chamaram-me de muitas coisas: irmã, amante, sacerdotisa, maga, rainha. O mundo das fadas afasta-se cada vez mais daquele em que cristo predomina. Nada tenho contra o Cristo, apenas contra os seus sacerdotes, que chama a Grande Deusa de demônio e negam o seu poder no mundo. Alegam que, no máximo, esse seu poder foi o de Satã. Ou vestem-na com o manto azul da Senhora de Nazaré – que realmente foi poderosa, ao seu modo –, que, dizem, foi sempre virgem. Mas o que pode uma virgem saber das mágoas e labutas da humanidade?
E agora que este mundo está mudado e Arthur – meu irmão, meu amante, rei que foi e rei que será – está morto (o povo diz que ele dorme) na ilha sagrada de Avalon, é preciso contar as coisas antes que os sacerdotes do Cristo Branco espalhem por toda parte os seus santos e lendas.
Pois, como disse, o próprio mundo mudou.
Houve tempo em que um viajante se tivesse disposição e conhecesse apenas uns poucos segredos, poderia levar sua barca para fora, penetrar no mar do Verão e chegar não ao Glastonbury dos monges, mas à ilha sagrada de Avalon: isso porque, em tal época, os portões entre os mundos vagavam nas brumas, e estavam abertos, um após o outro, ao capricho e desejo dos viajantes. Esse é o grande segredo, conhecido de todos os homens cultos de nossa época: pelo pensamento criamos o mundo que nos cerca, novo a cada dia.
E agora os padres, acreditando que isso interfere no poder do seu Deus, que criou o mundo de uma vez por todas, para ser imutável, fecharam os portões (que nunca foram portões, exceto na mente dos homens), e os caminhos só levam à ilha dos padres, que eles protegeram com o som dos sinos de suas igrejas, afastando todos os pensamentos de um outro mundo que viva nas trevas. Na verdade, dizem eles, se aquele mundo algum dia existiu, era propriedade de Satã, e a porta do inferno, se não o próprio inferno. Não sei o que o Deus deles pode ter criado ou não. Apesar das historias contadas, nunca soube muito sobre seus padres e jamais usei o negro de uma de suas monjas-escravas. Se os cortesãos de Arthur em Camelot fizeram de mim este juízo, quando fui lá (pois sempre usei as roupas negras da Grande Mãe em seu disfarce de maga), não os desiludi.
E na verdade, ao final do reinado de Arthur, teria sido perigoso agir assim, e inclinei a cabeça à conveniência, como nunca teria feito a minha grande Senhora, Viviane, Senhora do Lago, que depois de mim foi a maior amiga de Arthur, para se transformar mais tarde em sua maior inimiga, também depois de mim.
A luta, porém, terminou. Pude finalmente saudar Arthur, em sua agonia, não como meu inimigo e o inimigo de minha Deusa, mas apenas como meu irmão, e como um homem que ia morrer e precisava da ajuda da mãe, para a qual todos os homens finalmente se voltam. Até mesmo os sacerdotes sabem disso, com sua Maria sempre-virgem em seu manto azul, pois ela, na hora da morte, também se transforma na Mãe do Mundo.
E assim, Arthur jazia enfim com a cabeça em meu colo, vendo-me não como irmã, amante ou inimiga, mas apenas como maga, sacerdotisa, Senhora do Lago; descansou, portanto no peito da Grande Mãe, de onde nasceu, e para quem, como todos os homens, tem a finalidade de voltar. E talvez – enquanto eu guiava a barca que o levava, desta vez não para a ilha dos padres, mas para a verdadeira ilha sagrada no mundo das trevas que fica além do nosso, para a ilha de Avalon, aonde, agora, poucos, além de mim, poderiam ir – ele estivesse arrependido da inimizade surgida entre nós.(...)
A verdade tem muitas faces e assemelha-se à velha estrada que conduz a Avalon: o lugar para onde o caminho nos levará depende da nossa própria vontade e de nossos pensamentos, e, talvez, no fim, chegaremos ou à sagrada ilha da eternidade, ou aos padres, com seus sinos, sua morte, seu Satã e Inferno e danação...Mas talvez eu seja injusta com eles. Até mesmo a Senhora do Lago, que odiava a batina do padre tanto quanto teria odiado a serpente venenosa, e com boas razões, censurou-me certa vez por falar mal do deus deles.
“Todos os deuses são um deus”, disse ela, então como já dissera muitas vezes antes, e como eu repeti para as minhas noviças inúmeras vezes, e como toda sacerdotisa, depois de mim, há de dizer novamente, “e todas as deusas são uma deusa, e há apenas um iniciador. E cada homem a sua verdade, e Deus com ela”.
Assim, talvez a verdade se situe em algum ponto entre o caminho para Glastonbury, a ilha dos padres, e o caminho de Avalon, perdido para sempre nas brumas do mar do Verão.
Mas esta é a minha verdade; eu, que sou Morgana, conto-vos estas coisas, Morgana que em tempos mais recentes foi chamada Morgana, a Fada.
Marion Zimmer Bradley, As Brumas de Avalon